Dizer que o Brasil deu grande prioridade para as rodovias e esqueceu os outros meios de transportes constitui uma mentira tantas vezes repetida que acabou assumindo ares de verdade.
É fato que, graças ao dinheiro carimbado do Fundo Rodoviário Nacional, a malha rodoviária experimentou notável expansão até a década de 80.
Da mesma forma a malha pavimentada, inexpressiva no início da década de 50, experimentou notável crescimento, especialmente durante o governo Juscelino Kubitschek e o chamado “milagre brasileiro” da década de 70.
No entanto, nos últimos vinte anos, tanto o crescimento da malha total (9%) quanto da malha pavimentada (53%) foram inferiores ao avanço do PIB, que quase dobrou no período; e da frota de veículos, que, cresceu 2,5 vezes entre 1985 e 2009. Isso coloca o país no 18º lugar dentro do G-20 em matéria de número de veículos e número de mortes por quilômetro pavimentado.
Embora o Brasil tenha uma malha rodoviária de extensão razoável, apenas 13% das estradas são pavimentadas. Isso deixa o país na lanterna do G20 em relação a este quesito e contribui sobremaneira para encarecer o transporte. Estudos do extinto Geipot concluíram que o custo operacional de um veículo de carga aumenta 56% quando trafega em estrada de terra e não no asfalto.
Quando se relaciona, por meio do chamado Índice de Mortara, a extensão de rodovias pavimentadas com a extensão do país, frota, PIB e a população, o país continua na lanterna do G20.
Em 1988, a nova Constituição extinguiu o Imposto Único e proibiu a vinculação dos tributos a qualquer finalidade, exceto para a educação. Secaram completamente, portanto, as fontes de recursos para as rodovias.
Os investimentos públicos em transportes, que chegaram a representar 1,8% do PIB no final da década de setenta, entraram em queda livre. José Sarney ainda tirou da cartola o malsinado selo pedágio, que o Supremo Tribunal enterrou por ser inconstitucional.
Sem recursos até para tapar buracos, a saída do governo Fernando Henrique Cardoso foi dar a largada no processo de concessões das rodovias mais movimentadas. No final do seu governo, período no qual os gastos em transportes caíram abaixo de 0,2% do PIB, uma emenda constitucional restabeleceu vinculação e criou a CIDE – Contribuição Social e de Intervenção sobre o domínio Econômico. Lamentavelmente, segundo levantamento da CNT, 57% desses recursos arrecadados foram desviados das suas finalidades. Mesmo assim, os investimentos públicos em transporte apresentaram razoável recuperação, atingindo 0,66% do PIB este ano.
A relativa retomada dos últimos anos se deve, em parte, à criação do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. O programa inicial previa investimentos de R$ 33,4 bilhões em rodovias. Sua execução, no entanto, está bastante atrasada e vem dando origem à escândalos, que culminaram com o recente expurgo na cúpula do Ministério dos Transportes.
O resultado é que, embora o estado das rodovias tenha melhorado um pouco nos últimos sete anos, segundo a CNT, apenas 41,2% estão em condições ótimas ou boas. A entidade estima em 28% o aumento dos custos operacionais dos veículos de carga devido a esta situação.
Apesar de tudo isso, o governo lançou em 2010 uma ampliação do programa, batizada como PAC-2. Os investimentos em rodovias foram elevados para R$ 50,4 bilhões. Atualmente, o DNIT trabalha com orçamento de R$ 11 bilhões anuais, mas o próprio órgão reconhece que a necessidade é três vezes maior. Segundo o Plano de Logística para o Brasil, de 2010, da CNT, só para remover os gargalos imediatos do setor seria necessário investir imediatamente R$ 183 bilhões nas rodovias.
Embora em ritmo menos acelerado, tudo indica que o PIB continuará crescendo. Da mesma forma, devido à baixa taxa de sucateamento, a frota, especialmente a de caminhões, continuará sendo ampliada. Estudos da INEAVAR, de janeiro de 2011, projetam frota de 1,25 milhão de caminhões pesados para 2020.
O que é possível fazer para evitar o chamado “apagão” rodoviário? Um dos caminhos para melhorar a malha existente é continuar concedendo as rodovias à iniciativa privada. No caso do governo federal, em particular, no entanto, tudo indica que este processo está próximo do limite. A saída para estradas de menor fluxo seria a introdução das Parcerias Público Privadas, que ainda não saíram do papel.
Fala-se, como sempre, na transferência das grandes massas de cargas de baixo valor para as ferrovias e hidrovias. Apesar dos crônicos atrasos das obras, pode-se esperar algum alívio com a conclusão da Norte-Sul, da Transnordestina, da ligação ferroviária de Alto Araguaia a Rondonópolis e da eclusa de Tucuruí.
Embora o multimodal ainda esbarre em problemas tributários e de seguros, a integração dos transportes poderá contribuir para reduzir o tráfego de veículos de carga nos longos percursos.
Nada disso, no entanto, elide a necessidade de grandes investimentos públicos na ampliação da malha pavimentada, melhoria das condições de tráfego, ampliação de capacidade e duplicação das rodovias existentes.
Embora a matriz de transportes venha caminhando para um maior equilíbrio, o caminhão continuará sendo insubstituível no transporte da chamada carga geral, ou seja, as mercadorias de maior valor.
Sem rodovias, o Brasil pode parar.
Fonte: Transpodata